
Decisão da 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um clube náutico a indenizar os familiares de uma criança que morreu afogada ao ser sugada pelo duto de escoamento de água da piscina. A indenização por danos morais foi fixada em R$ 120 mil para cada um dos genitores e R$ 60 mil para cada irmã (com a observação de que a indenização devida à menor coautora deverá ser depositada em conta poupança e lá permanecer até que ela atinja a maioridade civil). Pelos danos materiais, para tratamento médico e psicológico, foi estipulado R$ 1,4 milhão, sob pena de multa diária de R$ 3 mil e limitada ao montante de R$ 3 milhões, sendo necessária periódica reavaliação médico-psicológica da necessidade de permanência da continuidade de tratamento.
A mãe da criança contou que, enquanto tomava banho de piscina com os três filhos, a equipe de manutenção do clube abriu a comporta de escoamento da água para esvaziar o tanque, sem aviso prévio aos banhistas. O menino foi violentamente sugado para o fundo da piscina, percorreu galeria subterrânea e morreu afogado.
Para o relator do recurso, desembargador Alexandre Bucci, é impossível deixar de reconhecer a atuação manifestamente culposa no evento que culminou com a morte da criança. “A precariedade do serviço de assistência médica disponibilizado aos usuários do clube, bem assim a má condição da ambulância para atendimento emergencial, apenas serviam para completar um triste quadro de má prestação de serviços, de evidente vício de informação aos usuários, evidenciando-se, pois, uma não afastável culpa no evento morte”, afirmou.
Os desembargadores Alexandre Lazzarini e Mauro Conti Machado também participaram do julgamento e acompanharam o voto do relator.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos do Apelação nº
0003665-30.2011.8.26.0619, da Comarca
de Taquaritinga, em que são apelantes/apelados
MARIO DONIZETE MARIA (JUSTIÇA
GRATUITA), DANIELA APARECIDA
DURANTE MARIA (REPRESENTANDO
MENOR(ES)), PALOMA NAYARA MARIA
e DAYRA PAOLA MARIA (MENOR(ES)
REPRESENTADO(S)), são
apelados/apelantes PORTO SEGURO
COMPANHIA DE SEGUROS GERAIS e CLUBE
NAUTICO TAQUARITINGA.
ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do
Tribunal de Justiça de
São Paulo, proferir a seguinte decisão:
"Não conheceram o agravo retido e deram parcial
provimento aos demais recursos.
V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que
integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos
Exmos. Desembargadores
ALEXANDRE LAZZARINI (Presidente) e
MAURO CONTI MACHADO.
São Paulo, 29 de setembro de 2015
ALEXANDRE BUCCI
RELATOR
Apelação nº 0003665-30.2011.8.26.0619 -
Taquaritinga - VOTO Nº 2263 - PÁGINA 2/35
VOTO NO. 2263
Apelação no. 0003665-30.2011.8.26.0619
Comarca: Taquaritinga (1ª. Vara Judicial)
Apelantes/Apelados: Mário Donizete Maria e outros
Apelante/Apelado: Clube Náutico Taquaritinga
Apelante/Apelada: Porto Seguro Companhia de Seguros
Gerais
Juiz de Direito: Diogo Volpe Gonçalves Soares
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.
Morte de menor, por afogamento, nas
dependências de clube náutico, ao ser
sugada a criança por duto de escoamento
da água de piscina durante
manobra de esvaziamento do tanque.
Sentença de parcial procedência dos
pedidos, na origem, condenado o clube
requerido ao pagamento de indenização
material, por tempo indeterminado,
voltada ao tratamento médico e
psicológico necessário aos coautores,
garantida, tal vertente indenizatória,
por formação de pecúlio no valor de
R$ 1.460.000,00, sob pena de multa
diária, arbitrada em R$ 3.000,00,
limitada ao montante de R$
3.000.000,00.
Condenação do clube requerido, ainda,
ao pagamento de indenização por
danos morais arbitrados em montante de
R$ 700.000,00 (setecentos mil
reais) para cada coautor genitor do
menor e em R$ 600.000,00 (seiscentos
mil reais) para cada coautora irmã.
RECURSOS MÚLTIPLOS.
Agravo retido do corréu Clube Náutico.
Pretensão de atribuição de efeito
suspensivo ao recurso de Apelação.
Matéria já decidida por conta de
anterior Agravo de Instrumento. Perda do
objeto.
Resultado: Agravo retido não
conhecido.
Recurso de Apelação do corréu Clube
Náutico.
Preliminar recursal.
A alteração, ex officio, do
limite da multa fixada em caso de eventual
descumprimento da obrigação de fazer
que não implica em ofensa ao
princípio da inalterabilidade da
sentença. Arguição de nulidade da sentença
afastada.
Mérito recursal.
Culpa do clube requerido pela morte do menor.
Caracterização. Ausência de
grelha de proteção do duto de
escoamento, ante a falta de serviços de
manutenção. Inexistente, demais disso,
observância do dever de cautela na
manobra de escoamento da água, efetuada
sem aviso aos banhistas que
ainda permaneciam no interior da
piscina. Dever de indenizar inafastável.
Danos materiais.
Necessária, na vertente afeta aos danos
materiais, uma periódica reavaliação
médico-psicológica da necessidade de
permanência da continuidade de
medicações e de prolongamento do
tratamento psicológico em favor dos
coautores identificados nos autos.
Reavaliação que será realizada
semestralmente, a partir do trânsito em
julgado deste V. Acórdão, em sede
de cumprimento de sentença, por experto
a ser oportunamente nomeado
pelo juízo, sob o custeio financeiro do
requerido, afastadas as ordens de
constituição de pecúlio ou instituição
de hipoteca legal, eis que inexistente
caráter alimentar nestas verbas,
prejudicada, ainda, em referência aos danos
materiais, a multa diária que havia
sido arbitrada na origem.
Danos morais.
Caracterização in re ipsa, tendo
em vista o evento traumático que acarreta a
perda trágica de ente querido.
Indenização, todavia, arbitrada com
visível exagero em primeiro grau.
Imperiosa redução dos respectivos
montantes indenizatórios anunciados na
origem, passando-se ao valor de R$
120.000,00 (cento e vinte mil reais) para
cada coautor genitor, bem como ao valor
de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais)
para cada coautora irmã.
Atualização monetária e juros de mora
computados em respeito às
orientações respectivamente indicadas nas
Súmulas 362 e 54 do STJ.
Observação de que a indenização de titularidade da
coautora menor deve ser
depositada em conta judicial até que a
mesma atinja a maioridade civil.
Eventual movimentação do numerário
sujeita à prestação de contas.
Resultado: Apelação provida em parte.
Recurso de Apelação da seguradora
denunciada.
Denunciação da Lide.
Danos Morais. Ausência expressa de cobertura
contratual. Exclusão
legítima. Dever de indenizar não
caracterizado nesta vertente da condenação
imposta ao denunciante. Dicção da
Súmula 402 STJ.
Regime sucumbencial na lide principal.
É proporcional e não solidária a
responsabilidade da seguradora denunciada
em relação aos ônus de sucumbência na
lide principal por ter a mesma
encampado teses de defesa que se
opuseram ao direito perseguido pelos
coautores. Demais disso, além de
proporcional, se define ser limitada a
responsabilidade sucumbencial da
seguradora, na lide principal,
adotando-se como base de cálculo desta
responsabilidade, apenas a vertente
condenatória afeta aos danos materiais,
respeitando-se, ainda, dentro desta
aludida proporção, o valor da
importância segurada prevista em contrato.
Resultado: Apelação provida em
parte.
Recurso de Apelação dos autores.
Regime sucumbencial. Honorários
Advocatícios.
Equivocado o arbitramento equitativo em
hipótese na qual há condenação
pecuniária. Verba honorária devida ao
patrono dos coautores readequada
para o percentual de 10% do valor total
e atualizado da condenação imposta
(artigo 20, parágrafo terceiro, CPC)
com apuração em sede de cumprimento
de sentença. Eventual redução no quantum
afeto aos honorários que não
implica em reformatio in pejus porquanto
também ventilada a questão em
apelo do requerido.
Resultado: Apelação provida em
parte.
A r. sentença de fls. 905/937 dos
autos, cujo pertinente
relatório é aqui adotado, julgou
parcialmente procedentes os pedidos
deduzidos por Mário Donizete Maria,
Daniela Aparecida Durante Maria,
Paloma Nayara Maria e Dayra Paola
Maria em sede de Ação de Indenização
movida em face de Clube Náutico
Taquaritinga.
Na mesma ocasião foi julgada
procedente a pretensão
deduzida pelo clube requerido por
força de denunciação da lide instaurada
em face de Porto Seguro Companhia de
Seguros Gerais.
Fê-lo, o ilustre magistrado, em
demanda na qual os coautores imputavam culpa ao clube requerido por conta da
morte do
menor João Paulo Jesus Maria, evento
este ocorrido nas dependências do
clube em data de 30/01/2011.
O menor falecera por afogamento, ao
ser sugado por
um duto de escoamento da água da
piscina em que se banhava, ocorridos os
fatos durante manobra de esvaziamento
do tanque, agindo os prepostos do
requerido de maneira negligente, eis que
aberta a comporta de escoamento
da água, sem que tivesse havido aviso
prévio aos banhistas que ainda se
encontravam no interior do tanque,
dentre eles, o menor, filho dos
coautores Mário e Daniela e irmão das
coautoras Paloma e Dayra.
Narrava mais a petição inicial que a
manobra fora
levada a efeito sem observância da
necessária presença da grelha de
proteção do duto.
Como se não bastasse, a atuação
culposa dos prepostos
do clube requerido mais saltava aos
olhos, diante da ausência de informação
visível aos associados a respeito da
manobra de escoamento, falhando,
demais disso, a estrutura voltada aos
primeiros socorros.
Com tais contornos definida a lide
principal,
reconhecido o abalo decorrente da
morte prematura do ente querido,
observe-se que o clube requerido foi
condenado ao pagamento de
indenização por danos morais
arbitrados em R$ 700.000,00 (setecentos mil
reais) em favor de cada coautor
genitor do menor falecido e em
R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais)
em favor de cada coautora irmã,
totalizando, portanto, esta vertente
da condenação, o montante de
R$ 2.600.000,00 (dois milhões e
seiscentos mil reais).
Tivemos ainda, a condenação solidária
do requerido e
da seguradora denunciada, ao
pagamento da quantia de R$ 2.225,81 a título
de danos materiais voltados a gastos
com honorários médicos, psicólogos e
medicamentos, devendo o referido
valor principal contar com atualização
monetária desde cada desembolso e
juros de mora de 1% ao mês, desde a
data de citação.
No que que se refere ao pleito de
indenização material
voltada ao acompanhamento médico e
psicológico que deveria ser custeado
em favor dos coautores Mário, Daniela
e Dayra, por tempo indefinido, a
r. sentença arbitrou indenização no
valor de R$ 123.000,00, impondo-se, em
garantia ao cumprimento desta
obrigação, a formação de pecúlio, em prazo
de sessenta dias a contar da
publicação da r. sentença.
Arbitrou-se, em caso de
descumprimento, multa diária
em valor de R$ 3.000,00, limitada, tal
sanção, ao montante de R$ 200.000,00.
Uma vez processualmente vencidos, o
requerido
denunciante e a seguradora denunciada
foram finalmente condenados,
solidariamente, ao pagamento de
custas, despesas processuais e verba
honorária favorável ao patrono dos
coautores, verba esta, arbitrada, por
equidade, em montante de R$ 80.000,00
(oitenta mil reais).
Em momento imediatamente posterior à
prolação da
r. sentença, sob argumento de
correção de erro material, o julgador singular
alterou o comando referente ao valor
total do dano material, em sua
vertente de acompanhamento médico e
psicológico, retificando, de ofício, o
ato decisório, em sua parte
dispositiva.
Da sentença passou então a constar
que a procedência e
o consequente decreto condenatório na
lide secundária decorrente da
denunciação era posto de modo a
impor, em desfavor do clube denunciante
e da seguradora denunciada, o
pagamento da quantia de R$ 1.476.000,00,
retificado, também de ofício, o teto
de incidência da referida multa diária,
passando-se ao valor de R$
3.000.000,00 (fls. 938/940).
Foram rejeitados Embargos de
Declaração de interesse
do requerido Clube Náutico (fls.
945) e também da seguradora denunciada
Porto Seguro (fls. 965).
Em atenção ao pleito da seguradora
denunciada
formulado às fls. 1003/1003verso, uma
retificação da r. sentença se viu às fls.
1004/1004 verso dos autos, sanando-se
novo erro material que dizia respeito
ao valor da condenação da seguradora,
novamente ajustando-se o
dispositivo da r. sentença, desta
feita, para que dele constasse a
responsabilidade da seguradora
denunciada era limitada ao valor de
R$ 100.000,00, nos termos de expressa
restrição contida na apólice
secundária (fls. 643).
Todavia, ainda assim não conformadas
com o resultado
atribuído à lide em primeiro grau, as
partes interpuseram apelos múltiplos,
insistindo, ainda o requerido, na
apreciação da matéria questionada em
anterior recurso de Agravo retido de
seu interesse.
O clube requerido, no que se refere
ao aludido Agravo
Retido, demonstrava seu inconformismo com o
recebimento do apelo dos
coautores somente no efeito
devolutivo.
Quanto à Apelação (fls. 974/998)
preliminarmente
reclamava o requerido da nulidade da
r. sentença, porquanto descabida, a
retificação, de ofício, do teto de
incidência da multa diária, ultrapassados, de
maneira indevida, os limites
estabelecidos no artigo 463, inciso I, do Código
de Processo Civil.
No mérito, propriamente dito, em
matéria de culpa pelo
evento morte, ressaltava o requerido
a qualidade de suas instalações e
benfeitorias levadas a efeito na
formação de seu polo aquático, informando,
ainda, a regularidade de seu funcionamento
perante os órgãos públicos.
Sinalizava-se com o reconhecimento de
possível
situação de culpa concorrente dos
pais do menor falecido, considerando que
a eles cabia dever de vigilância
sobre o filho, notadamente, quando cientes,
ainda, do procedimento diário de
escoamento da água da piscina.
Mais adiante, o clube requerido fazia
menção à
adequada prestação de primeiros
socorros ao menor, novamente
destacando a existência de
informações claras e visíveis a respeito do uso da
piscina em questão.
Aliás, a referida piscina não seria
recomendada para
crianças, posto que abastecida com
água turva e barrenta, captada, no início
do dia, da represa e escoada, no
final da tarde, para o riacho contíguo.
Particularmente em relação aos danos
materiais,
entendia o requerido que a opção por
valor hipotético a título de
acompanhamento médico e psicológico
seria injusta, haja vista que não
fundada a decisão em prova pericial.
Nesta vertente de indenização, tida
como extremamente
gravosa a ordem de constituição de
pecúlio, sem falar na desnecessidade de
substancial aporte financeiro, ante o
valor da obrigação mensal inicialmente
antevista, o argumento era de que tal
obrigação não se revestia de caráter
alimentar, sugerindo-se, pois, meio
menos gravoso, tal qual a constituição
de hipoteca nos termos do disposto no
artigo 466 do Código de Processo
Civil.
E caso não fosse afastado o dever de
indenizar, em
caráter subsidiário combatia o
requerido o montante arbitrado a título de
indenização por danos morais, devendo
ser afastado o exagero que ensejava
enriquecimento sem causa e consequente
destruição do próprio objeto social
do clube, ventilando-se possível
arbitramento de verba indenizatória
familiar una.
Registre-se, finalmente, por parte do
requerido, a
existência de protestos pelo
reconhecimento da situação de sucumbência
recíproca ou eventual redução da
verba honorária que lhe fora imposta.
A seguradora denunciada, comprovando
o
adimplemento espontâneo da condenação
que lhe fora imposta, com o
acerto numérico final havido depois
de integrada pela segunda vez a r.
sentença, trouxe aos autos
comprovante de depósito do montante de
R$ 118.070,93 (fls. 1016).
Sem prejuízo, a referida seguradora
denunciada, Porto
Seguro, apresentava seu recurso de Apelação
(fls. 1054/1070) pugnando pela
exclusão de sua condenação solidária
nos encargos sucumbenciais atrelados
à lide principal.
No entender da denunciada não dera
ela causa a esta
lide, afigurando-se, então,
equivocada sua condenação em verbas de
sucumbência que eram de
responsabilidade do clube denunciante.
Em caráter subsidiário, a seguradora
protestava fosse a
verba de sucumbência por ela devida
arbitrada proporcionalmente à
responsabilidade financeira das
partes, isto é, limitado seu ônus
sucumbencial à uma fração de sua
sucumbência na lide secundária.
Havia, ainda, pretensão recursal
subsidiária por meio
da qual a seguradora sugeria que caso
mantida fosse sua condenação nos
ônus de sucumbência na lide principal
tal obrigação fosse limitada pelo
valor da importância prevista em
contrato.
Sob outro ângulo, os coautores, em
razões recursais de
fls. 950/963, exclusivamente
defendiam a majoração da verba honorária,
sugerindo que a mesma fosse arbitrada
em patamar compreendido entre
10% e 20% do valor da condenação, em
respeito aos critérios indicados no
artigo 20, parágrafo terceiro, do
Código de Processo Civil.
Pugnavam, em suma, pelo provimento da
insurgência,
não se justificando o arbitramento
equitativo que se mostrara ínfimo se
comparado com o valor total da
condenação imposta.
Anote-se ainda, como intercorrência
relevante, em
primeiro grau, a interposição de Agravo
de Instrumento, por parte do clube
requerido reclamando a concessão de
efeito suspensivo ao recurso de
Apelação por ele interposto (fls. 1146/1162),
recurso este provido em
julgamento desta C. 9ª. Câmara de
Direito Privado datado de 26/08/2014.
As razões de apelo do clube requerido
foram aditadas
(fls. 1168/1171), ratificando-se
anteriores argumentos e apontando-se, ainda,
ser nula a decisão de 1004/1004verso,
descabida a alteração de mérito
introduzida no ato decisório.
Segundo o requerido, igualmente
descabida a
modificação meritória que limitara a
responsabilidade da seguradora
denunciada.
Execução provisória, atendendo ao
pedido dos
coautores (fls. 1135/1139) restou foi
deferida pelo juízo de origem (fls. 1141)
e por meio de petição, os autores
deduziam a inscrição da sentença na
matrícula do imóvel de propriedade do
requerido e concordavam com a
concessão de efeito suspensivo ao
recurso de Apelação (fls. 1176/1181).
Os recursos foram recebidos e
regularmente
processados em primeiro grau (fls.
965 e fls. 1128), constatando-se a
apresentação de contrarrazões por
parte do clube requerido em relação ao
recurso de interesse dos coautores
(fls. 1009/1011) havendo também a
apresentação de contrarrazões destes
últimos em relação ao recurso do
requerido (fls. 1075/1103),
decorrendo, finalmente, sem manifestação, o
prazo assegurado para as
contrarrazões da seguradora denunciada
(Certidão de fls. 1197).
Já com os autos em segundo grau, ante
o interesse de
menor no polo ativo, tivemos a
manifestação do órgão do Ministério
Público.
Opinava o parquet no sentido
do arbitramento de multa
diária com razoabilidade, ventilando
o resultado de parcial provimento do
recurso do clube requerido.
Trazia o ilustre representante
ministerial, naquilo que a
lide lhe permitia manifestação,
considerações em torno de responsabilidade
solidária do requerido e da seguradora
denunciada, por todo o espectro
condenatório, vale dizer, devendo
responder também a seguradora,
segundo o órgão ministerial, pelos
danos morais, nos limites contratuais,
posto que ausente qualquer cláusula
de exclusão neste sentido
(fls. 1201/1204).
É o relatório do quanto essencial.
Nestes autos de Ação de
Indenização os coautores
imputavam culpa ao clube requerido
por conta da morte do menor João
Paulo Jesus Maria, evento este
ocorrido nas dependências do clube em data
de 30/01/2011.
O menor falecera por afogamento, ao
ser sugado por
um duto de escoamento da água da
piscina em que se banhava, ocorridos os
fatos durante manobra de esvaziamento
do tanque, agindo os prepostos do
requerido de maneira negligente, eis
que aberta a comporta de escoamento
da água, sem que tivesse havido aviso
prévio aos banhistas que ainda se
encontravam no interior do tanque,
dentre eles, o menor, filho dos
coautores Mário e Daniela e irmão das
coautoras Paloma e Dayra.
De tal sorte, reconhecido o abalo
decorrente da morte
prematura do ente querido, observe-se
que o clube requerido foi condenado
ao pagamento de indenização por danos
morais arbitrados em R$ 700.000,00
(setecentos mil reais) em favor de
cada coautor genitor do menor falecido e
em outros R$ 600.000,00 (seiscentos
mil reais) em favor de cada coautora
irmã.
Totalizava, portanto, esta vertente
da condenação afeta
aos danos morais, em desfavor do
clube requerido, o montante de
R$ 2.600.000,00 (dois milhões e
seiscentos mil reais).
Tivemos ainda, a condenação solidária
do requerido e
da seguradora denunciada, ao
pagamento da quantia de R$ 2.225,81 a título
de danos materiais voltados a gastos
com honorários médicos, psicólogos e
medicamentos, devendo o referido
valor principal contar com atualização
monetária desde cada desembolso e
juros de mora de 1% ao mês, desde a
data de citação.
No que que se refere ao pleito de
indenização material
voltada ao acompanhamento médico e
psicológico que deveria ser custeado
em favor dos coautores Mário, Daniela
e Dayra, por tempo indefinido, a r.
sentença arbitrou indenização com
números finais atingidos depois de
ratificada a deliberação originária
tida como equivocada numericamente
falando.
Com o referido acerto que foi
realizado de ofício, da
sentença passou então a constar que a
procedência e o consequente decreto
condenatório na lide secundária
decorrente da denunciação era posto de
modo a impor, em desfavor do clube
denunciante e da seguradora
denunciada, o pagamento da quantia de
R$ 1.476.000,00 (hum milhão,
quatrocentos e setenta e seis mil
reais).
Igualmente, retificado, também de
ofício, o teto de
incidência da multa diária para
hipótese de descumprimento deste
comando, eleito o valor de R$
3.000.000,00 (fls. 938/940).
Postas tais balizas introdutórias,
anuncia-se que o
recurso de Agravo retido de interesse
do clube requerido não será
conhecido, enquanto que todos os
recursos de Apelação, sob outro ângulo,
comportam parcial provimento,
passando-se, então, a explicitar os
fundamentos do voto conforme
capítulos decisórios que se seguem
delimitados:
Recursos do Clube Náutico
Taquaritinga:
Agravo retido:
Em relação ao recurso de Agravo
retido interposto pelo
requerido às fls. 969/973 dos autos,
a esta altura do trâmite do feito, pouco é
necessário dizer.
Ocorre que diante do trânsito em
julgado do V. Acórdão
proferido quando do julgamento do
recurso de Agravo de Instrumento
também de interesse do requerido, terminou
por ser atribuído o efeito
suspensivo que se perseguia em sede
de Apelação.
Vê-se, pois, que repetida (antes do
Agravo de
Instrumento) idêntica matéria de insurgência
no bojo do Agravo retido ora
em questão, fato é que neste último
recurso não mais há interesse recursal
(vivo) que justifique o conhecimento,
com o que, se anuncia o resultado de
não conhecimento do Agravo retido,
ante a perda de seu objeto.
Apelação:
Ao enfrentar o recurso de Apelação do
clube requerido,
com destaque preliminar, afasta-se a
propalada nulidade da r. sentença, eis
que, a alteração, ainda que levada a
efeito ex officio, do limite da multa diária
atrelada à obrigação na formação de
pecúlio, para garantia da indenização
material arbitrada, não se mostrou
ilegal.
E não há ilegalidade na deliberação,
posto que não
existem óbices processuais para a
imposição e posterior revisão da
expressão pecuniária da multa,
instrumento claramente voltado à
efetividade no comando da sentença1,
nem de longe verificada ofensa ao
princípio da inalterabilidade da
decisão, com o que se rejeita a arguição
preliminar suscitada pelo requerido.
Em relação ao mérito do apelo do
clube requerido,
impossível deixar de reconhecer a
atuação manifestamente culposa no
evento de esvaziamento da piscina que
culminou com a morte do menor
João Paulo.
1 CPC, artigo 461, § 6º.
Note-se que em data de 30 de janeiro
de 2011, em
momento no qual buscava deixar a
piscina, o menor foi arrastado pelo
movimento repentino da água,
proveniente da abertura manual de
comporta em manobra de escoamento.
Com isto, terminou o menor por ser
sugado pelo duto
de vazão, percorrendo galeria
subterrânea até parar sob a “caixa de
inspeção” (poço de visita), obstruída
por tijolos de alvenaria, situação que
impediu eventual possibilidade de
sobrevivência.
Não fosse tal empecilho, haveria,
talvez, ainda, a
possibilidade de o menor ser lançado,
com a força da água, para o riacho de
deságue, o que, contudo, não se deu.
Diante da situação, resgatado neste
poço de visita,
identificado na superfície por placa
de concreto e aparentando, segundo
testemunha, já estar sem vida,
recebeu o menor os primeiros socorros de
parte de seu genitor, como também por
parte de outros associados.
O menor foi então conduzido em
ambulância do clube,
desguarnecida de cilindro de oxigênio,
ao hospital mais próximo, local em
que fora constatado o óbito.
Diante deste quadro de
responsabilidade civil subjetiva,
importa dizer que o agente só pode
ser pessoalmente censurado, ou
reprovado na sua conduta, quando em
face das circunstâncias concretas da
situação, caiba afirmar que ele podia
e devia ter agido de outro modo.
E isto inegavelmente se viu em
relação aos prepostos do
clube requerido, os quais poderiam e
deveriam ter agido de maneira diversa
em relação aos antecedentes que
ensejaram o afogamento do menor.
Observe-se que a piscina na qual se
deram os fatos
funcionava exclusivamente aos finais
de semana e feriados, sendo, nestes
dias, abastecida, pela manhã, com
água da represa, a qual, ao final do dia,
era escoada por meio de um duto
subterrâneo até um riacho de deságue.
Vê-se, que no dia específico de
ocorrência dos fatos, ao
proceder à manobra de captação, pela
manhã, das águas da represa, o
funcionário do clube não somente
desprezou a ausência da grade de
proteção na entrada do duto de
escoamento, encostando-a,
negligentemente, como se aparafusada
estivesse, como também deixou de
comunicar tal fato ao funcionário
vespertino.
Este último, por seu turno, pese
embora não alertado
acerca do perigo da situação,
igualmente agiu de maneira culposa, vale
dizer, imprudente, eis que iniciada
manobra de escoamento da água sem
que tivesse sido feita verificação da
grelha de proteção do duto por onde
sairia a água. Não foram avisados,
ainda, os banhistas a respeito do início
do esvaziamento, o que mais ainda se
justificava, ante a presença de um
menor no interior da piscina naquele
momento.
Esta vertente de atuação culposa, bom
que se ressalte,
foi corroborada pelo relato seguro da
testemunha Kátia Carina Valério, a
qual, ouvida em juízo afirmou que:
“no primeiro mês de funcionamento do
tobogã, os funcionários do clube foram
rigorosos, não deixando crianças
adentrarem sozinha no tobogã da piscina, e mesmo na hora de esvaziarem a
piscina, não acionavam a comporta
antes de todos deixarem o interior da piscina; ocorre que, a partir de
então, os funcionários começaram a
ficar mais maleáveis, e não mais pediam para que as crianças
deixassem a piscina no momento de
escoarem a água da mesma”.
E prosseguia o relato testemunhal
desfavorável ao clube
requerido:
“após levantada a comporta da
piscina, o funcionário se retirou do local (...) Um
fato que chamou a atenção da
depoente, foi que naquela data, quem acionou a comporta da piscina, foi um
funcionário que de costume não é
responsável em liberar a drenagem da água, bem como, outra questão que
lhe chamou a atenção, foi que
geralmente os funcionários não abrem completamente a referida comporta, já
que dessa vez, a tábua que fecha a
comporta havia sido levantada até o fim, e talvez isso fez com
que o fluxo de água tivesse uma saída
mais intensa;
A depoente gostaria de informar também, que por
várias vezes viu a citada piscina
vazia, e que no buraco da vazão da água, não havia nenhuma tela
de proteção, porém todos ali
acreditavam que o sistema de drenagem tivesse uma grade de
proteção interna ao lado da comporta, da mesma forma que há na comporta
da lagoa”. (fls. 207/208,
destaquei).
Também a prova pericial realizada sob
os cuidados da
Polícia Científica concluiu que faltavam
duas buchas de fixação em dois orifícios e
todos os três parafusos de fixação
caracterizando a falta de uso recente (fls. 217).
Por essa somatória de falhas e
condutas culposas é que
o menor João Paulo, com cinco anos de
idade, foi, então, sugado pela força
da água escoando rapidamente em
direção ao duto, percorrendo galeria
subterrânea, onde ficou preso, em
determinado espaço denominado poço de
visita, obstruído por tijolos de
alvenaria (fls. 224).
É o quanto basta à configuração da
responsabilidade
subjetiva do Clube Náutico, ex
vi do quanto disposto no artigo 186 do Código
Civil, de nada servindo as menções
genéricas à regularidade de instalações
e procedimentos, o mesmo se aplicando
aos argumentos em torno da
adoção das cautelas e diligências de
praxe.
Nem de longe se poderia, ainda,
cogitar de possível
culpa concorrente por falha dos pais,
quando, no caso concreto, a genitora
do menor se encontrava na água em
companhia deste, surpreendido pela
força da repentina sucção.
Tanto não houve falha na vigilância
que cabia aos pais
desempenhar que o genitor assim que
percebeu a situação, atirou-se à água,
desesperado, com intenção de salvar a
vida do filho.
A precariedade do serviço de
assistência médica
disponibilizado aos usuários do
clube, bem assim a má condição da
ambulância para atendimento
emergencial, apenas serviam para completar
um triste quadro de má prestação de
serviços, de evidente vício de
informação aos usuários,
evidenciando-se, pois, uma não afastável culpa no
evento morte.
Bem caracterizada a culpa, vejamos,
ainda em atenção
ao apelo do requerido, as vertentes
de indenização e suas respectivas
quantificações.
Danos materiais.
Forçoso reconhecer que há nos autos
comprovação do
reembolso do requerido em favor dos
coautores relativamente às despesas
com funeral e outras (fls. 379/381,
fls. 385, fls. 397, fls. 403, fls. 405, fls. 407,
fls. 410 e fls. 418).
Há também comprovação de pagamento de
remédios e
tratamento psicológico às coautoras
menores Daniela e Dayra (fls. 382/384,
fls. 386/396, fls. 398, fls. 402,
fls. 404, fls. 406, fls. 408/409, fls. 411/417 e
fls. 419) no importe de R$ 18.225,73
(dezoito mil e duzentos e vinte e cinco
reais e setenta e três centavos),
gastos estes havidos antes da propositura da
demanda em data de 29/06/2011.
Mas, além destes referidos valores,
já restituídos, temos
nos autos a presença de um
demonstrativo de valores gastos, mensalmente,
com o tratamento psicológico à autora
Dayra no valor de R$ 2.880,00
(dois mil e oitocentos e oitenta
reais), referentes ao período de julho de 2011
a dezembro de 2012 (fls. 855/872).
Caso estes valores ainda não tenham
sido
reembolsados, caberá ao clube
requerido fazê-lo, após atualização
monetária a partir de cada desembolso
e incidência de juros de mora a fluir
desde a citação, o que resta aqui
determinado, ainda que incidentalmente.
Tais despesas são decorrências
(indiretas) do evento
morte e devem ser ressarcidas pelo
causador do dano.
Merece análise mais detalhada,
todavia, a obrigação
imposta ao requerido no que se refere
ao custeio, por prazo indeterminado,
de medicamentos aos autores Mário e
Daniela e de acompanhamento
psicológico à menor Dayra, imposição
esta que levou à determinação, pela
r. sentença, de formação de pecúlio
em valor finalmente ajustado em
R$ 1.476.000,00, em garantia ao
cumprimento do comando jurisdicional
voltado à obrigação de fazer.
Neste tema, conquanto não se ignore a
existência de
inquestionável abalo psicológico
imposto aos coautores por conta do evento
morte, o decurso de razoável intervalo
de tempo desde os fatos não
recomenda prevaleça, indefinidamente,
o subjetivismo em matéria de
custeio de tratamento médico e
psicológico, notadamente, quando não
definido termo final para a
obrigação.
Faz-se, pois, imperioso
estabelecer-se como necessária
uma periódica reavaliação
médico-psicológica da necessidade de
permanência da continuidade de
medicações e de prolongamento do
tratamento psicológico.
A providência aqui anunciada mais se
justifica se
atentarmos para o fato de que, seja
em relação às consultas médicas e
medicamentos, seja no que se refere
aos gastos com terapia, nada mais foi
anexado aos autos, além dos
comprovantes exibidos às fls. 855/872.
Tal reavaliação realizar-se-á, pois,
semestralmente, a
partir do trânsito em julgado deste
V. Acórdão, em sede de cumprimento de
sentença, por experto a ser
oportunamente nomeado pelo juízo, sob o
custeio financeiro do requerido.
A aludida reavaliação deve ser
individualizada em
relação a cada coautor, indicando-se
razões pelas quais deve o custeio de
medicamentos ou o tratamento
psicológico continuar (ou se, ao contrário,
deve ser interrompido).
Ao assim se decidir, entende-se ser
necessário
estabelecer o grau de comprometimento
medicamentoso e emocional que o
evento desencadeou em cada um dos
coautores.
Sabe-se que cada ser humano reage
diversamente
perante o infortúnio, impondo-se,
pois, análise individualizada para que
seja, então definida de maneira
justa, no aspecto da delimitação temporal e
econômica, a obrigação imposta ao
clube requerido nesta vertente da
condenação, obrigação esta que como
visto, pode vir a cessar em
determinado momento, em relação a um
coautor, em particular, ou
mesmo em relação a todos os
coautores, se for o caso.
E tendo em vista que tal vertente
indenizatória
claramente não ostenta caráter
alimentar, conforme anunciado de maneira
incidental quando da anterior decisão
proferida por ocasião do julgamento
do Agravo de Instrumento já
referido, anoto que cai por terra a ordem de
instituição de pecúlio, providência,
demais disso, extremamente gravosa ao
devedor, entidade sem aparentes fins
lucrativos.
Tenho igualmente prejudicada, por
consequência lógica
do afastamento do pecúlio, maior
polêmica em matéria de multa diária e
sua quantificação, perdendo razão de
ser qualquer deliberação a respeito da
multa, que não mais se justifica.
Igualmente desnecessária a ventilada
instituição da
hipoteca legal, ante uma condenação que se mostra
sem mínima liquidez e
que dependerá de periódicas
reavaliações.
Neste tema, em particular,
observe-se, por ser
pertinente, que mesmo se validado
fosse o caráter alimentar da obrigação,
de acordo com a melhor interpretação
doutrinária do artigo 475-Q do
Código de Processo Civil, não se
afiguraria necessariamente obrigatória a
ordem de constituição de capital.
Assim o é, posto que superada a
dicção expressa na
Súmula 313 STJ (cf. Luiz
Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, In
Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo,
ed. RT, 2008, p. 483),
caberá ao juízo de origem desfazer,
em momento oportuno, eventuais
providências e deliberações adotadas
em sede de execução provisória,
desde que tenham sido tais
providências e deliberações executivas
contrárias aos comandos ora
anunciados nesta decisão.
Consigno, neste ponto, ter sido
acertada a condenação
solidária da seguradora (Porto
Seguro) ao pagamento do valor devido pelo
clube requerido no que se refere à
indenização por dano material, nos
limites da apólice contratada (R$
100.000,00).
Não se altera nesta instância,
portanto, o que já havia
sido anunciado em sede de decisão
retificadora proferida em primeiro grau
(fls. 1004/1004verso).
A correção feita na origem não
implicava em nulidade,
trazendo à lide secundária, como
deveria ser, conformação numérica
compatível com a cobertura
contratada.
Neste sentido, vale dizer, admite-se
a condenação
solidária e adstrita aos limites da
cobertura contratual, conforme já decidiu
o C. STJ (Resp no.
925.130/SP).
Ainda no campo da responsabilidade da
seguradora
pelo sinistro, anote-se não ser
possível impor-lhe, solidariamente ao
segurado, o pagamento de indenização
por dano moral.
A apólice contratada entre as partes,
de maneira clara e
expressa, trazia estampada cláusula
excludente neste sentido (item III,
primeira cláusula, alínea “u” - fls.
646), inviabilizando a condenação
(Súmula
402 do STJ)2.
No âmbito deste E. Tribunal de
Justiça o entendimento
é idêntico, admitindo-se como lícita,
portanto, possível, a delimitação de
risco que decorre da exclusão de
cobertura dos danos morais (Recurso de
Apelação. no.
0053424-76.2007.8.26.0562,
Rel. Des. Gilson Delgado Miranda,
j. 07/04/2015 e Recurso de
Apelação no. 0015513-34.2008.8.26.0032, Rel. Des.
Hamid Bdine, j. 18/03/2015) e com
isto temos definida, pois, nos termos retro
expostos, a correta delimitação da
vertente condenatória afeta aos danos
materiais.
2 Súmula 402 STJ: “O contrato de seguro por danos
pessoais compreende os danos morais, salvo
cláusula expressa de exclusão”.
Há, em relação a estes referidos
danos materiais, nos
limites da cobertura contratada,
responsabilidade solidária entre clube
denunciante e seguradora denunciada,
o que nos permite agora enfrentar a
vertente condenatória afeta à
indenização por danos morais.
Danos morais.
Evidente que a morte do filho dos
coautores Mário e
Daniela e do irmão das coautoras
Paloma e Dayra, vivenciada sob o
comando do desespero e da sensação de
impotência na alteração do trágico
desfecho carrega consigo o dano in
re ipsa, ou seja, decorrente do próprio
fato ofensivo.
Compreende-se, pois, ser dispensável "a
prova de prejuízo
para demonstrar a ofensa ao moral
humano, já que o dano moral é tido como lesão à personalidade,
ao âmago e à honra da pessoa, por vez
é de difícil constatação, haja vista os reflexos atingirem parte
muito própria do indivíduo - o seu
interior".
(STJ - REsp no. 85.019-RJ, DJ 18/12/1998).
Como se sabe, ante a ausência de
parâmetros legais
objetivos, resta ao julgador a
difícil tarefa de quantificar o abalo gerado por
condutas ilícitas, e a doutrina e
jurisprudência acabaram por estabelecer
critérios que auxiliam na apuração de
um valor razoável e proporcional.
Por isso se diz que a fixação do
valor do dano moral
deve levar em conta as funções ressarcitória
e também punitiva da
indenização.
Na função ressarcitória,
olha-se para a vítima, para a
gravidade objetiva do dano que ela
padeceu (Antônio Jeová dos Santos,
Dano Moral Indenizável, Lejus Editora,
1.997, p. 62).
Já na função punitiva,
ou de desestímulo do dano
moral, olha-se para o lesante, de tal
modo que a indenização represente
advertência, sinal de que a sociedade
não aceita seu comportamento.
(Carlos Alberto Bittar, Reparação Civil por Danos Morais, p.
220/222;
Sérgio Severo, Os Danos Extrapatrimoniais, p.
186/190).
É da congruência entre as duas
funções que se extrai o
valor da reparação, sendo certo que
no caso concreto, pese embora a trágica
consequência não há como se
convalidar os valores manifestamente
exagerados definidos em primeiro
grau, seja em favor dos pais, seja em
favor das irmãs do menor falecido.
Raciocinar em sentido contrário,
seria, com a
indenização, levar a insolvência o
ofensor, enriquecendo, em contrapartida
os beneficiários da recompensa
pecuniária que se estabelece, o que não é o
objetivo da sanção por danos morais.
Razoabilidade e proporcionalidade
indicam, destarte,
ser medida de rigor, a redução das
indenizações afetas aos danos morais,
elegendo-se aqui, em substituição aos
valores indicados em primeiro grau, o
montante de R$ 120.000,00 (cento e
vinte mil reais) para cada um dos
coautores genitores e também de R$
60.000,00 (setenta mil reais) para cada
uma das coautoras irmãs.
As indenizações permanecem
individualizadas, não se
recomendando o estabelecimento de cota
indenizatória única, familiar,
sobretudo, ante a presença de uma
coautora menor no polo ativo.
Demais disso, cabe ao requerido
compreender que mais
de um membro de uma mesma família
pode ajuizar Ação autônoma ou
integrar a mesma lide, em
litisconsórcio, contra o causador do dano moral e
obter a indenização que lhe é devida,
de maneira individualizada, como
ocorreu no presente caso, de modo
que, não vingam, os protestos do
requerido em matéria de unificação do
quantum indenizatório.
Os respectivos valores retro
indicados e atrelados aos
danos morais deverão contar com a
incidência de atualização monetária
oficial, desde a data deste
arbitramento que é substitutivo, prevalecendo a
dição expressa na Súmula 362 STJ,
evitando-se o indesejado bis in idem em
matéria de atualização monetária.
Deve ainda haver, em relação aos
valores principais, a
incidência de juros de mora, em
patamar de 1% ao mês, com contagem a
partir do ilícito (evento morte),
respeitando-se matéria de ilícito
extracontratual, o teor da Súmula 54
STJ, não se podendo dizer ser
contratual a relação que se
estabelecia para o uso das piscinas do ente
meramente associativo.
Lança-se, a esta altura, uma observação
no sentido de que
a indenização por danos morais que é
devida em favor da menor coautora
Dayra, deverá ser depositada em conta
poupança e lá permanecer até que
esta atinja a maioridade civil,
quando poderá dispor livremente do valor
que lhe cabe.
Eventual movimentação do numerário de
titularidade
da referida menor, antes do
aniversário de 18 (dezoito) anos, estará sujeita à
prestação de contas, nestes próprios
autos, por parte dos genitores,
preservando-se assim os interesses da
menor.
Com estes fundamentos se encerra, em
grande parte, o
enfrentamento do recurso de Apelação
do clube requerido, ainda que se
retorne a tema de interesse do
requerido, mais adiante, quando da análise
do regime sucumbencial.
Vejamos, pois, os recursos de
Apelação de interesse dos
coautores e de interesse da
seguradora denunciada à lide, encaminhando-se
o voto já para sua parte final.
Recurso dos coautores:
Apelação:
Regime sucumbencial.
Em matéria de regime sucumbencial, os
questionamentos recursais dos
coautores, do clube requerido e também da
seguradora denunciada serão tratados
neste capítulo decisório único.
Não se justificava arbitrar por
equidade os honorários
advocatícios devidos em favor do
nobre patrono dos coautores.
Ainda que substancial o valor eleito
na origem, qual
seja, o valor de R$ 80.000,00, havia
que se respeitar a regra prevista no
parágrafo terceiro do artigo 20 do
Código de Processo Civil, posto tratarmos
de demanda na qual sobreveio
condenação, fazendo jus, portanto, o patrono
da parte vitoriosa, ao arbitramento
de sua remuneração com base na
totalidade das verbas condenatórias.
E diante da redução já anunciada nas
linhas acima em
relação às indenizações por danos
morais, nem se argumente de exagero ou
de desproporção capaz de justificar a
manutenção do critério equitativo.
Também não há lastro para um genérico
pleito de
redução dos honorários, tal qual fora
preconizado pelo requerido em seu
apelo. Consigne-se ser manifestamente
equivocado falar-se em decaimento
recíproco a justificar a exclusão de
responsabilidade do clube requerido
pelos ônus de sucumbência, tal qual
fora ventilado por este último em seu
recurso.
O não acolhimento do quantum indenizatório
em
qualquer das vertentes do pedido não
significava que o requerido não
tivesse dado causa à propositura da
Ação.
Afinal à luz do princípio da
causalidade, o dever de
suportar tal ônus é de quem deu causa
à instauração do Processo:
“Responde pelo custo do processo
aquele que haja dado causa a ele, seja
ao propor demanda inadmissível ou sem
ter razão, seja obrigando quem tem razão a vir a juízo
para obter ou manter aquilo a que já
tinha direito”. (Cândido Rangel Dinamarco, In
Instituições de Direito Processual
Civil, vol. II, 6ª edição, São Paulo, Malheiros, 2006, p.
666-667).
Destarte, respeitadas as
considerações postas, de parte a
parte, em matéria de verba honorária,
considero que o patamar de 10% do
valor total e atualizado das
condenações impostas se mostra adequado para
fins de remuneração do advogado dos
coautores.
Apurar-se-á o quantum efetivamente
devido a título de
honorários em sede de cumprimento de
sentença mediante cálculos
aritméticos.
Com isto bem se remunera o grau de
zelo demonstrado
pelo nobre patrono dos coautores,
sopesando-se, ainda, a relevância da
causa e seus incidentes processuais e
recursais, além do tempo de
tramitação, vislumbrando-se, pois, o
resultado de provimento parcial do
apelo dos coautores.
E não há reformatio in pejus,
se, em termos práticos, for
reduzido o valor final dos honorários
do patrono dos coautores, eis que a
matéria havia sido devolvida ao E.
Tribunal, não somente por conta do
apelo dos requerentes, como também
por conta de insurgência ventilada
pelo requerido, de modo que,
tecnicamente possível se mostra a deliberação
de segundo grau que venha a ser
eventualmente desfavorável
numericamente aos interesses do
patrono beneficiário da verba honorária
sucumbencial.
Recurso da seguradora denunciada à
lide:
Apelação:
Regime sucumbencial.
Ainda na lide principal, agora em
atenção aos reclamos
da denunciada Porto Seguro,
rejeita-se a pretensão recursal que pugnava
por nenhuma responsabilidade da
seguradora em matéria de ônus de
sucumbência na lide principal.
Ocorre que ao aderir à defesa
apresentada pelo
denunciante na lide principal, em
verdade, a seguradora denunciada
encampou a lide, de modo que,
corolário lógico da condenação imposta ao
clube denunciante é que a denunciada
- que deduz pretensão contrária ao
direito postulado pelos coautores -
também sofra repercussão desfavorável
em matéria de ônus de sucumbência.
E pouco importava o fato de não ter
havido resistência
na lide secundária eis que tratamos
de verba que diz respeito à lide
principal.
Afinal ao deduzir matéria de mérito
que terminava por
se contrapor ao direito subjetivo
postulado na Ação dita principal, se impõe
à seguradora arcar com os encargos
processuais que resultam da derrota
processual imposta a ela que assumiu
condição análoga à de litisconsorte
passivo.
Contudo, não obstante devesse mesmo
ser
responsabilizada a seguradora pelos
ônus de sucumbência na lide principal,
creio que se mostrava justificável,
em parte, seu apelo.
Imperioso o afastamento da
responsabilidade solidária
da seguradora pelos ônus de
sucumbência na lide principal.
A solidariedade (na condenação
principal) não
irradiava efeitos para atingir a
responsabilidade pelos ônus de
sucumbência, sendo expresso o artigo
23 do Código de Processo Civil, ao
definir que concorrendo diversos
autores e diversos réus, os vencidos
respondem pelas despesas e honorários
em proporção.
Dito isto, temos como certo é que
proporcional a
responsabilidade da seguradora pelas
verbas sucumbenciais impostas na
lide principal, proporcionalidade
esta que resta delimitada nos limites de
sua responsabilidade financeira.
Melhor dizendo, além de proporcional,
é limitada a
responsabilidade sucumbencial da
seguradora, Porto Seguro, na lide
principal, adotando-se como base de
cálculo apenas os danos materiais,
respeitando-se, ainda, dentro desta
proporção, o valor da importância
segurada prevista em contrato, por
isso merecendo o resultado de parcial
provimento o apelo da denunciada.
Estes são, em suma, os fundamentos
que bastam para o
bom e técnico equacionamento dos
recursos, de parte a parte, afigurando-se
desnecessária a menção a outros
dispositivos legais ou mesmo a formal
resposta da Turma Julgadora a
eventuais questionários de
prequestionamento.
Do quanto foi exposto, pelo teor do
meu voto, nesta
oportunidade, delimitam-se as finais
e conclusivas propostas, ora lançadas
nos seguintes termos e para os fins
que se seguem explicitados:
a) NÃO SE CONHECER do Agravo
retido e também
DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de Apelação, ambos
interpostos
pelo requerido Clube Náutico
Taquaritinga.
Em relação ao recurso de Apelação retro
mencionado o
resultado de parcial provimento se
dá:
a) de modo a estabelecer como
necessária, na vertente
afeta aos danos materiais, uma
periódica reavaliação médico-psicológica da
necessidade de permanência da
continuidade de medicações e de
prolongamento do tratamento
psicológico em favor dos coautores
identificados nos autos.
Tal reavaliação realizar-se-á
semestralmente, a partir do
trânsito em julgado deste V. Acórdão,
em sede de cumprimento de
sentença, por experto a ser
oportunamente nomeado pelo juízo, sob o
custeio financeiro do requerido,
afastadas as ordens de constituição de
pecúlio ou instituição de hipoteca
legal, prejudicada, ainda, em referência
aos danos materiais, a multa diária
que havia sido arbitrada na origem.
b) com vistas à redução dos valores
afetos às
indenizações por danos morais,
respeitados os critérios de incidência de
atualização monetária e juros de
mora, conforme indicados no corpo do
voto.
Elegem-se aqui, em substituição aos
valores indicados
em primeiro grau, o montante de R$
120.000,00 (cento e vinte mil reais) para
cada um dos coautores genitores e o
montante de R$ 60.000,00 (setenta mil
reais) para cada uma das coautoras
irmãs.
Neste recurso é lançada observação
no sentido de que a
indenização por danos morais que é
devida em favor da menor coautora
Dayra, deverá ser depositada em conta
poupança e lá permanecer até que
esta atinja a maioridade civil, sendo
certo que eventual movimentação do
numerário de titularidade da referida
menor estará sujeita à prestação de
contas, nestes próprios autos.
Há também a proposta que é lançada no
sentido de
DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de Apelação dos
coautores, tão
somente com vistas a readequar o
critério de arbitramento da verba
honorária imposta em desfavor de
denunciante e denunciada, na lide
principal, de maneira que, restam
redefinidos os honorários devidos ao n.
patrono dos coautores, em patamar de
10% do valor total e atualizado das
condenações impostas, apurando-se o quantum
devido em sede de
cumprimento de sentença.
Sem prejuízo das deliberações retro,
propõe-se,
finalmente, DAR PARCIAL PROVIMENTO
ao recurso de Apelação de Porto
Seguro Cia. de Seguros Gerais, seguradora denunciada à lide,
definindo-se ser
proporcional e limitada a
responsabilidade sucumbencial da seguradora, na
lide principal.
Neste tema, para fins de verba
honorária devida pela
denunciada na lide principal,
adotar-se-á como base de cálculo apenas os
danos materiais, respeitando-se,
ainda, dentro da aludida proporção de
responsabilidade, o valor da
importância segurada prevista em contrato,
permanecendo, no mais, sem outras
alterações, a respeitável sentença
guerreada.
ALEXANDRE BUCCI
Relator
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Bem vindo!